A desmoralização da notícia


O jovem repórter de economia me escreve desanimado. É uma das grandes revelações do jovem jornalismo responsável. Meticuloso na apuração, cuidadoso nas deduções, tem o compromisso da informação correta em primeiro lugar.

Ontem, com os mercados ainda abertos, a seção Radar, de Veja, solta a nota irresponsável: "Levi redigiu cartão de demissão e se reunirá com Dilma". O mercado explode, as redações enlouquecem, saem todos à cata da confirmação da notícia.

Levy chega de uma reunião com Dilma às 17:58 e entra no elevador do Ministério, denotando enorme irritação. Seus assessores informam que está irritado com as pressões de Lula e do PT contra o ajuste fiscal, mas apenas isso. Não escreveu carta nenhuma e nem pensa em demissão.

Nem bem chega no seu gabinete e a mesma seção Radar solta outra nota - agora com os mercados já fechados: "Levy não entrega carta e permanece no cargo, mesmo insatisfeito". Como se a primeira nota não fosse de sua autoria.

Para não ficar para trás, outros colunistas embarcam na onda e alimentam o caldeirão de boatos.

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Voltemos ao jovem repórter: "Jornalismo não pode ser isso. Notas de dois parágrafos, uma atrás da outra, com informações desencontradas, falando a interesses de cada fonte".

A malícia desse jornalismo fast food consiste em transformar em fato o boato que é meramente verossímil. Levy está insatisfeito? Sim. Pode sair? Pode. É o que basta para transformar o verossímil em fato acabado. Afinal, um dia aquela notícia ainda será verdadeira.

Daí o desabafo: "Você passa horas, dias em cima de coisas complexas, sofrendo pressão de todos os lados, para conseguir um pé de página. E essa turminha do jornalismo de notas fast food ou das colunas idênticas fica desfilando boatos sem nenhum esforço de apuração".
 
Por Luis Nassif